Registrada desde 1989, a Aldeia São Domingos, lar do povo Iny Karajá, recebeu pela primeira vez atendimento jurídico e administrativo por meio do projeto Defensorias do Araguaia.
Localizada próxima ao município de Luciara, em Mato Grosso, a comunidade enfrenta desafios na regularização documental e em outras questões judiciais e previdenciárias.
O cacique Rafael Tewahyte Karajá destacou a importância dessa iniciativa dentro da aldeia: “Nunca tivemos uma ação assim aqui, e nossa comunidade enfrenta muitas dificuldades para ir até a área urbana em busca de atendimento, principalmente devido à barreira linguística”.
A língua Karajá, ou Iny˜ rybe (a fala dos Iny˜), pertencente ao tronco linguístico Macro-Jê, é predominantemente falada nas aldeias por todas as gerações, com o português sendo pouco praticado, especialmente pelos mais velhos.
O trabalho das Defensorias teve início no ano passado, com a identificação das aldeias e de suas demandas.
Na Defensoria Pública de Mato Grosso, a Coordenadoria de Ações e Interações Comunitárias (CAIC) é responsável por fazer o primeiro contato com as comunidades.
A defensora pública-geral, Luziane de Castro, ressalta a importância de conhecer e respeitar a cultura local. Atualmente mais de 40 famílias e 245 pessoas moram na aldeia.
“Quando entramos em uma aldeia, estamos preparados para oferecer o atendimento necessário e, principalmente, para fazer parte, conhecer e participar de suas tradições. É um esforço colaborativo, com o INSS participando de forma inédita nesta edição. Essa é a essência da Defensoria Pública, sair de seus gabinetes e estar onde a população mais precisa”, afirma Luziane.
Atendimentos
Dirahybo Karajá veio da Aldeia Fontoura para registrar sua filha, Tuaideru Karajá Cardoso, de 2 anos. Ela já havia tentado registrar a menina no cartório do município, mas sem sucesso.
Letícia Amorim, defensora pública de Tocantins, que atendeu o caso, explica que a situação evidencia a importância das Defensorias do Araguaia.
“Ela queria registrar a criança, mas não conseguiu porque o nascimento ocorreu dentro da aldeia. Até aquele momento, não havia um registro oficial da existência da menina, e isso é um dos maiores problemas entre as populações vulneráveis. Uma pessoa sem registro não tem acesso aos direitos de fato e de direito”, ressalta Letícia.
Com 87 anos, Coraciua Karajá participou do mutirão para corrigir seu documento, que sempre esteve com erros. Além de ter o local de nascimento incompleto, seu sobrenome também estava incorreto.
“É uma felicidade poder resolver isso. Meu nome é valioso para mim, e esse erro me causou muitos problemas”, disse ele.
Tairo Esperança, defensor público de Goiás, que atendeu o caso de Coraciua, explica que, agora, o idoso terá acesso aos serviços públicos que antes não conseguia devido aos documentos incorretos.
“Parece uma situação simples, mas muitas vezes eles não conseguem resolver sozinhos. Fizemos o pedido de alteração, e o documento dele será corrigido agora”, explica Tairo.
Ação em Conjunto
Além do atendimento jurídico das Defensorias Públicas, durante a ação itinerante nas aldeias, diversos serviços foram disponibilizados, como a emissão de documentos, serviços da Receita Federal, questões previdenciárias e atendimento na área da saúde.
Uma parceria essencial nessa ação é com a Defensoria Pública da União (DPU).
“É a primeira vez que a DPU tem a oportunidade de vir às aldeias desta região e prestar assistência jurídica. Muitas demandas de competência federal foram atendidas, e também avaliamos questões de saúde e problemas que merecem um tratamento coletivo. É gratificante entregar este trabalho a pessoas que merecem um atendimento digno e de qualidade”, explica a defensora pública federal, Diana Freitas.
A caravana das Defensorias Públicas concluirá seu trabalho no dia 21, nas Aldeias Bdeduré e Buridina, no município de Aruanã (GO).
Os atendimentos começaram na segunda-feira, 17, na Aldeia Fontoura, em Lagoa da Confusão (TO) e continuaram nesta quarta-feira (19) na Aldeia São Domingos, em Luciara (MT).