A professora Marcia da Costa e Faria, 61 anos, aguarda ansiosa o cumprimento da decisão do Tribunal de Justiça, que determina a recondução dela, no prazo de dez dias, ao cargo de professora do ensino fundamental da Escola Municipal Soteco, localizada na zona rural de Cáceres. A idosa foi exonerada em abril, do contrato temporário que vence em dezembro de 2023, e procurou a Defensoria Pública de Mato Grosso, para se restabelecer da ilegalidade e injustiça, que se diz vítima.
Marcia informa que é professora há 30 anos e, desde o ano passado, morava e trabalhava na fazenda Soteco, onde funciona a escola de mesmo nome, que fica 100 km da cidade de Cáceres, e onde ela dava aula para o 4º e 5º ano do ensino fundamental. Este ano, ela conta que passou por um novo processo seletivo, o número 362/2023, foi aprovada e assumiu a carga horária de 30 horas para as mesmas séries. Porém, no dia 28 de abril, ao chegar para trabalhar foi informada que estava exonerada.
“Trabalho nessa escola desde o ano passado, em toda a minha vida de professora nunca sofri uma advertência, nunca respondi a nenhum processo administrativo, nunca infringi as regras ou deixei de cumprir meu trabalho e nunca tinha sido demitida. Então, pra mim o rompimento do contrato, antes da data e sem qualquer explicação, foi uma surpresa muito ruim. Tentei descobrir com diretora, com o secretário, com a prefeita o motivo e ninguém me informou nada. Por honra, por dignidade, fui atrás dos meus direitos”, conta.
ATUAÇÃO DA DEFENSORIAO defensor público da comarca de Cáceres, Saulo Castrillon, solicitou informações administrativas do motivo do rompimento do contrato à Secretaria Municipal de Educação e recebeu do secretário, Fransérgio Rojas Piovesan, a seguinte informação: “a rescisão deveu-se à ajustes na equipe, necessários à manutenção da qualidade de ensino e harmonia no ambiente de trabalho”.
Diante do fato, questionou a decisão, num mandado de segurança, com pedido de liminar, argumentando que, mesmo que os contratos temporários possam ser rompidos por atos discricionários dos administradores públicos, eles devem obedecer ao que define o inciso II do artigo 5º e o artigo 37 caput da Constituição Federal, que garantem o direito de defesa à parte, além dos princípios de publicidade, impessoalidade, moralidade, eficiência, norteados pelo princípio da legalidade.
“Embora se trate de contrato de trabalho com prazo, a rescisão só poderia ocorrer: no caso realização de concurso público, no prazo de sua vigência; no caso de término do prazo contratual; por iniciativa do contratado ou por iniciativa do contratante, sempre que o contratado não atender a produtividade esperada pelo Município, conforme as cláusulas 13ª e 14ª do documento e segundo preconizam os artigos 11 e 12 da 1.931/2005, que trata da contratação por tempo determinado para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público e, dá outras providências”, diz trecho do mandado.
Como não conseguiu a liminar na Justiça da Comarca, o defensor protocolou um agravo de instrumento no Tribunal de Justiça, solicitando revisão da decisão anterior, e reforçando o pedido de que o ato de exoneração da professora fosse anulado, por ser ilegal e arbitrário, e que ela recebesse os valores do período que ficou fora da escola.
“Ora, no caso concreto, a motivação apresentada pela autoridade para justificar a rescisão antecipada do contrato de trabalho da professora e sua consequente exoneração do cargo público não se amolda a nenhuma das cláusulas 13ª e 14ª do contrato, nem tampouco encontra ressonância nas hipóteses taxativamente previstas nos artigos 11 e 12 da Lei nº 1.931/2005; daí porque o ato administrativo é manifestamente ilegal, devendo, portanto, ser anulado”, pede o defensor.
Castrillon reforça, ainda, que a rescisão foi ilegal e arbitrária, já que a necessidade de professor para atender à escola, persiste e foi demonstrada com a contratação de uma nova professora, três dias após a notícia da exoneração de Marcia.
DECISÃOA desembargadora da Primeira Câmara de Direito Público e Coletivo do Tribunal de Justiça, Maria Aparecida Ribeiro, acatou, em partes, o pedido liminar do defensor, determinando que a Secretaria Municipal de Educação de Cáceres reconduza a professora ao cargo, em dez dias, após a intimação. A decisão foi publicada na segunda-feira (26/6). Mas, não determinou que ela receba o pagamento pelos dias parados.
“Ainda não fui contactada pela Prefeitura, mas fiquei muito feliz com a decisão e estou aguardando a vaga de volta. Minha vida está parada, minhas contas, tenho dois filhos e desde a interrupção, sem motivo justo, estou desempregada. Sem contar que acredito que o trabalho da Defensoria Pública, do Ministério Público - fiz uma denúncia lá também - e da Justiça, me ajudam a resgatar a minha dignidade. Ao longo de toda a minha vida, nunca passei por isso”, afirma a idosa.