Na última quarta-feira (17), teve início a segunda etapa da perícia judicial proposta pela Defensoria Pública do Estado de Mato Grosso (DPEMT) nas glebas Pompeia de Nova Marilândia e Santo André III, situadas entre os municípios de Santo Afonso e Nova Marilândia (252 km de Cuiabá).
A área rural, onde já chegaram a morar 300 famílias, é motivo de uma disputa de terra que dura mais de 27 anos entre a empresa Usinas Itamarati S.A. (dona da área), a Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Estado de Mato Grosso (Fetagri), e as associações de pequenos produtores rurais locais.
De acordo com a defensora pública Raquel Regina Souza Ribeiro, que propôs a perícia à Justiça, estão sendo realizadas visitas em cada terreno, identificando todos os moradores, as benfeitorias feitas, se há plantações, criação de gado, entre outros itens.

“Tudo está sendo fotografado e documentado para a terceira fase, em que vai ser feito um laudo circunstanciado, através dessa equipe de peritos, para responder nossos quesitos (perguntas escritas para esclarecimento) e os quesitos da UISA (Usinas Itamarati), e voltar ao desembargador para a homologação do acordo”, explicou.
No dia 20 de agosto, ocorreu a abertura dos trabalhos periciais, na Escola Municipal Sebastião Tavares da Silva, no município de Santo Afonso.
A defensora afirmou que a perícia oficial é importante para identificar as pessoas que vivem no local e passar para a última fase do processo, que seria identificar as pessoas que têm interesse em permanecer no local, indenizando
a UISA pelo valor do lote, ou a desocupação do assentado com o recebimento
pelas benfeitorias realizadas e a valorização do local.
Em 2014, a Justiça produziu um relatório que indicou que cerca de 60 famílias ocupavam a área da Fazenda Santo André, onde criavam gado leiteiro e possuíam uma cooperativa de laticínios, e 100 famílias que residiam na Fazenda Pompeia, onde também produziam leite.

Entenda o caso – Tudo começou com um contrato de comodato, firmado em agosto de 1998, referente às fazendas Pompéia e Santo André, situadas nos municípios de Santo Afonso e Arenápolis, entre a Usina Itamarati (proprietária da área) e a Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Estado de Mato Grosso.
Comodato é o empréstimo gratuito e temporário de um bem que não é fungível, ou seja, não pode ser substituído por outro da mesma qualidade.
Nesse tipo de contrato, o comodante (quem empresta) cede o uso de um objeto, como um imóvel, ao comodatário (quem recebe), que tem a obrigação de devolvê-lo nas mesmas condições.
“Aqui foram assentadas 300 famílias com a promessa de, em seis meses, serem enquadradas no programa de reforma agrária. Só que os anos foram passando, passaram-se quase cinco anos e não aconteceu essa tão sonhada reforma agrária. Então, a Usina Itamarati precisou promover uma ação judicial pedindo a reintegração da posse. A partir desse momento que toda essa demanda teve um cunho judicial, que iniciou na comarca de Arenápolis e hoje está tramitando em Cuiabá”, detalhou a defensora, que participou da perícia no local.

Em fevereiro de 2014, o Juízo da Vara Especializada em Direito Agrário da Capital realizou uma audiência de conciliação entre as partes.
Na época, o Incra considerou que as áreas eram inapropriadas para o programa de reforma agrária porque 88% da terra seria imprópria (terreno arenoso), as ocupações estão fora do padrão, grande parte dos ocupantes não preenchem o perfil do programa, e os processos administrativos já foram arquivados.
Já o Fetagri sugeriu a realização de um estudo na área para identificar as ocupações, bem como as famílias que possuem o perfil para a reforma agrária, com a exclusão das que não se encaixam.
Em março de 2014, a Usina Itamarati requisitou a reintegração de posse. Porém, em junho, o Ministério Público Estadual (MPMT) pediu o indeferimento da liminar e a fixação dos pontos de controvérsia.
Depois, em outubro de 2016, a Justiça converteu o processo em cumprimento de sentença.
Na sequência, em dezembro, a usina pediu a expedição do mandado de reintegração de posse.
Com isso, em maio de 2017, a juíza Adriana Sant'Anna Coningham efetuou uma inspeção judicial na área, na qual constatou que havia pessoas assentadas que não faziam parte da ação originária.
Após nova audiência de conciliação, a magistrada da Vara de Direito Agrário de Cuiabá determinou a suspensão dos autos pelo prazo de 90 dias, para que as partes fizessem um acordo.

Em junho de 2017, a Defensoria Pública Estadual solicitou a habilitação nos autos, bem como a inclusão no processo da Associação de Pequenos Produtores Pecuaristas Unidos da Gleba Pompéia de Nova Marilândia.
Logo depois, em maio de 2018, a Justiça intimou a DPEMT para apresentar a relação atualizada dos ocupantes da Gleba Pompeia.
Depois disso, em fevereiro de 2020, foi realizada outra audiência de conciliação, que suspendeu novamente o feito, por 180 dias.
Então, em julho de 2022, a Defensoria juntou aos autos a relação das pessoas assentadas na área e, em outubro, solicitou a desapropriação judicial.
Na sequência, em dezembro de 2023, o Juízo converteu o cumprimento da sentença em desapropriação judicial privada indireta ou desapropriação por posse/trabalho e, com isso, negou o pedido de expedição do mandado de reintegração.
Diante disso, os representantes legais da Usina Itamarati interpuseram recursos de agravo de instrumento, em fevereiro e abril de 2024, que tramitam na 4ª Câmara de Direito Privado Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT).
Posteriormente, em fevereiro, a desembargadora Serly Marcondes Alves concedeu liminar para suspender o andamento do cumprimento de sentença até o julgamento do recurso.
Em agosto, a Procuradoria-Geral do Estado (PGE-MT) informou que o poder público estadual não tinha interesse na desapropriação.
Logo que foi procurada pela Associação de Pequenos Produtores e Pecuaristas Unidos da Gleba Pompéia de Nova Marilândia (APPUGPNM) e pela Associação dos Pequenos Produtores Rurais da Gleba Santo André III, a Defensoria Pública de Segunda Instância solicitou a habilitação nos autos.
Em junho, a Itamarati comunicou que tinha interesse em realizar um acordo e solicitou a remessa dos autos para a conciliação da segunda instância, pedido acatado pela desembargadora Serly, que determinou a remessa do recurso para a Central de Mediação.
A audiência de mediação foi realizada, em setembro, ocasião em que as partes optaram pela realização de um acordo, que consiste na realização de uma
perícia judicial na área.
A usina ficou encarregada de pagar os honorários do perito e todos os trâmites processuais foram suspensos.

Em abril de 2025, o Centro Judiciário de Solução de Conflitos e Cidadania (Cejusc) de Segundo Grau acatou a prorrogação do prazo solicitada pelo perito e intimou as partes a apresentar os quesitos, ou seja, formular perguntas escritas para esclarecimento.
Logo depois, a Itamarati pagou 50% dos honorários periciais e, em julho deste ano, o perito apresentou o cronograma de realização da perícia.
Finalmente, no dia 20 de agosto, ocorreu a abertura dos trabalhos periciais, na Escola Municipal Sebastião Tavares da Silva, entre as glebas Pompeia e Santo André III, no município de Santo Afonso.
Por fim, ontem (17) teve início a segunda etapa da perícia judicial, com a expectativa de que o processo pericial termine em dezembro.
Após a conclusão da perícia, a Justiça vai decidir sobre a indenização das famílias que realizaram benfeitorias no local e se vai ocorrer, ou não, a reintegração de posse da área.